12 de dez. de 2012

PRÓLOGO E EVANGELHO DA INFÂNCIA


1ª PARTE – PRÓLOGO (1, 1-4)
São Lucas é o único dos evangelistas que apresenta um prólogo antes do evangelho. Neste, ele anuncia o assunto sobre o qual vai escrever: o que significa para ele, a vida de Jesus e o nascimento da Igreja. Apoia-se na tradição, escrevendo de forma ordenada o que era ensinado na catequese da Igreja primitiva. Pretende confirmar o que as “testemunhas oculares” e os “ministros ou servidores da Palavra” relataram. Estes são os Apóstolos e o Evangelho que pregaram, bem como referência a fontes escritas como o Evangelho segundo São Marcos e outros escritos e testemunhos.
Seguidamente, refere o método utilizado. Foi uma pesquisa cuidadosa “desde as origens”, com um trabalho minucioso de historiador. Os “factos” narrados, referem-se à vida e missão de Jesus, testemunhados pelos discípulos de Jesus: são a Boa-Nova, o Evangelho que, em LUCAS é transmitido. Mas estes são apresentados, mais do que usando uma ordem cronológica, antes adopta um método pedagógico e bem pensado dos acontecimentos e da doutrina de Jesus.
Finalmente, LUCAS dedica o seu livro a “Teófilo”, que significa, em grego, “amigo de Deus”. Este é todo o cristão ou pagão, sobretudo no mundo grego do seu tempo, a quem LUCAS apresenta uma apologia da fé crista.


2ª PARTE – EVANGELHO DA INFÂNCIA (1, 5 – 2, 52)
A construção literária do evangelho da infância em LUCAS apresenta um paralelo entre João Baptista e Jesus Cristo. Os episódios têm correspondência paralela, o que evidencia a unidade de acção de Deus em João Baptista e em Jesus (ver tabela abaixo). A finalidade fundamental destas narrativas é a de apresentar o mistério de Jesus e, secundariamente, a missão de João Baptista, o Precursor, através de uma série de mensagens sobrenaturais pelos anjos, por algumas personagens, como Simeão e Ana, e finalmente, pelo próprio Jesus (2, 49).



Anúncio do nascimento de João Baptista (1, 5 – 25)
O começo da narrativa começa à maneira das antigas histórias bíblicas (“No tempo de Herodes”). Esta apresenta um processo de transformação de um vazio, representado pela esterilidade de Isabel, para um enchimento, representado pela aparição do anjo a Zacarias e realizado pela Palavra de Deus e pela gravidez de Isabel. Este processo entra em contraste pela segunda transformação, a mudez de Zacarias por não acreditar na Palavra de Deus. O nascimento de João vem trazer uma nova esperança, vem encher os corações do povo de Deus com a alegria do Messias que está para nascer.

v.5) Herodes, o Grande, filho do idumeu Antipas ou Antipater, foi nomeado rei da Judeia pelo Senado Romano em 40 a.C. (morto em 4 d.C.). Era um político hábil e um grande construtor. A classe de Abias, à qual pertencia Zacarias, era a oitava em 24 das classes que serviam o Templo.

v.7) A esterilidade era considerada motivo de humilhação, vergonha e castigo. Esta história apresenta semelhanças notáveis com a história de Sara e Abraão (Gn 18, 11), Rebeca (Gn 25, 21), Raquel (Gn 30, 22), a mulher de Manoah (mãe de Sansão - Jz 13, 2) e Ana (mãe do profeta Samuel - 1 Sam 1, 5) . Zacarias e Isabel representam a comunidade dos pobres e oprimidos, para quem Deus se volta e de onde nascerá João, o último profeta da Antiga Aliança.

v.9) Os sacerdotes entravam no altar de manhã e à tarde, quando era a oferta do sacrifício, para renovar as brasas e os aromas no altar do incenso, feito de ouro, que se encontrava no Santo dos Santos.

v.12) O “Temor” sentido por Zacarias era uma perturbação habitualmente sentida pelo ser humano no confronto com o mistério de Deus, presente em revelações, milagres e outras intervenções divinas. Deus comunica com o homem mediante o seu anjo, mas mais importante que a visão, que apenas serve de apoio, é a mensagem, comunicada por um autêntico mensageiro de Deus, que ocupa um lugar de honra, entre o altar e o candelabro de sete braços.

v. 13) Zacarias é tranquilizado com a fórmula habitual “Não temas”, usada pelos anjos nas aparições. A resposta de Deus à ignomínia de Zacarias e Isabel está contida no nome “João”, que significa “o Senhor faz graça” ou “Deus compadece-se”. Além de uma resposta à prece deste casal, este menino tem ainda uma missão especial.

v.14) “João” é o portador da alegria messiânica nas primeiras manifestações da vinda do Messias. Esta alegria é a resposta ao dom da salvação presente em Jesus Cristo.

v.15) A missão do Precursor é profética: mantém-se diante do Senhor como um Servo, é um asceta consagrado a Deus, e está predestinado pelo Senhor desde o ventre da sua mãe para uma especial missão.

v.17) A missão de João é semelhante aos antepassados Levi e Elias: levar Israel à conversão; abrirá o caminho para a chegada do Messias, que iniciará a História da libertação dos pobres.

v.19) O anjo Gabriel é enviado para anunciar a Boa-Nova. Enquanto que Marcos usa o termo “Evangelho”, Lucas utiliza os termos “Boa-Nova”, “evangelizar”, usando o verbo, e não a designação.

v.20) Perante a incredulidade de Zacarias, que pede um sinal  como se a palavra de Deus devesse justificar-se a si mesma, o dom divino faz-se acompanhar da retribuição, pois a palavra que fecunda Isabel encontra o sinal na mudez de Zacarias. Esta mudez perante a palavra de Deus não se trata tanto de uma punição, mas principalmente um sinal que permite guardar o segredo do nascimento, que será revelado a Maria apenas em altura própria, sendo esta a razão pela qual Isabel fica oculta durante cinco meses.

v.23) “Terminados os dias” é uma expressão que transmite a ideia da realização das profecias. João é, para LUCAS, o profeta escatológico de que fala Malaquias (Mal 3, 1.24). “Mais do que um profeta” (Mt 11, 9), João tem a missão de reconciliar e ajudar à conversão do povo de Deus para se prepararem para a vinda do Messias. João baptizou o Salvador e encaminhou para Ele os primeiros discípulos. A Igreja celebra o seu nascimento a 24 de Junho, no solistício de Verão, pois João é uma “lâmpada” cuja luz deve diminuir ao aparecer a Luz verdadeira (Jo 1, 8-9; Jo 5, 36; Jo 3, 30). João é modelo dos pregadores e dos crentes que devem desaparecer diante d’Aquele que anunciam, para “preparar os Seus caminhos”.

O anúncio do nascimento de João Baptista é o primeiro sinal da vinda de Messias, é um sinal de alegria e de esperança, no novo Messias que vai nascer. Tal como Isabel permanece oculta, também para nós o tempo do Advento é um tempo de recolhimento e de preparação para receber Deus “que nos vem visitar como sol nascente”. Como nos prepararmos devidamente para o receber? Podemos deter-nos na mensagem de conversão do coração que João nos vem trazer e procurar viver verdadeiramente esta mudança interior, esvaziando-nos do que não interessa, e enchendo-nos do Amor que Deus nos traz por meio do Seu “Filho muito amado”.