10 de set. de 2013

4ª PARTE – MINISTÉRIO DE JESUS NA GALILEIA (4, 14 – 9, 50)

Início da pregação (4, 14-15) Jesus dá início à sua tarefa missionária, impelido pelo Espírito, manifestando-se através da Sua Palavra e da Sua acção, levando a salvação a todos os homens e ajudando estes a compreender progressivamente o Seu mistério. Jesus em Nazaré (4, 16-30) Esta cena é o pano de abertura para a missão evangelizadora de Jesus: caracterizando o que será a mensagem de Jesus – a salvação para todos - e a forma como esta vai ser acolhida, com forte oposição de Israel. Começa a pregar na sinagoga num dia de sábado, como também o apóstolo Paulo fará mais tarde (Act 13, 14-41). v.18-19) Jesus lê a passagem do profeta Isaías (Is 61, 1-2 e 42, 7), que evocava a consagração de um profeta. Tal como um profeta, Jesus recebeu o Espírito no Baptismo para proclamar a Boa-Nova aos pobres e para oferecer a liberdade e a luz a todos os necessitados. v.19-21) Jesus não é, no entanto, um profeta qualquer, pois recebeu a unção do Espírito de forma plena do Pai, pelo que, com Jesus começam os tempos de graça, a que se refere como “ano favorável” (ano jubilar, celebrado a cada cinquenta anos). Mas este ano é o “hoje” da salvação, e ao anunciar a chegada deste tempo, Jesus procura apelar à conversão, “porque está próximo o Reino de Deus” e anunciar que esta salvação chega por meio d’Ele, tornando-se o centro da mensagem. v.22-23) As pessoas não têm uma reacção positiva, pois não compreendem quem é verdadeiramente a pessoa de Jesus: pedem-lhe milagres, apelando ao seu direito de compatriotas, não se abandonam verdadeiramente ao seu projecto de salvação. v.24-27) Jesus reconhece que os corações das pessoas da sua terra não estavam abertos para O ver de verdade e para abraçar a conversão: contesta este direito de compatriotas que reclamavam, referindo de forma velada, e através de exemplos do passado, que a salvação virá para os pagãos porque estes é que a conseguirão acolher de coração livre e aberto. v. 28-30) A reacção do povo é uma antevisão do que acontecerá na Paixão, pois já pretendem matá-lo. Israel não percebe que Jesus é a própria mensagem de salvação, e esta é muito mais importante do que os milagres que realiza. Por isso, Jesus será rejeitado pelo Seu povo e crucificado.

4 de set. de 2013

3ª PARTE – PREPARAÇÃO PARA O MINISTÉRIO (3, 1 – 4, 13)

LUCAS segue o caminho das outras narrativas da tradição evangélica, situando a pregação de João Baptista antes do começo da missão de Jesus. Estes elementos – a pregação do Baptista, o baptismo de Jesus e as tentações no deserto – conferem sentido a toda a missão e constituem o prelúdio da mesma. LUCAS preocupa-se em apresentar João como o precursor do anúncio da salvação de Deus para todos os homens, que se revelará em Jesus Cristo. João não é Jesus, mas a sua pregação já faz parte da Boa-Nova que Jesus vem trazer para a humanidade. Pregação de João Baptista (3, 1-6) v. 1-2) LUCAS começa por situar a missão de João Baptista no tempo e no espaço, indicando a data com referência ao imperador Tibério, sendo correspondente ao ano 28 da nossa era. Indica quem governava a Judeia e as províncias respectivas: Pôncio Pilatos e os tetrarcas, estando Herodes responsável pela Galileia, e os pontífices - Caifás, que era o Sumo Sacerdote, e Anás, chefe do povo e sogro de Caifás. v. 3) João não é apresentado a pregar no deserto, mas antes nas margens do Jordão, uma zona bastante povoada. O verbo “pregar” (“kêrusso”) significa a proclamação pública de um arauto, sendo um verbo frequente no vocabulário cristão primitivo, associado aos Apóstolos e aos primeiros missionários. João pregava um baptismo de penitência, que era um sinal exterior da mudança de vida necessária para acolher o Messias que iria chegar. v. 4-5) João Baptista aplica o texto de Is 40, 3-5 a Jesus. O Senhor vai chegar e é preciso aplanar os caminhos para que Ele possa chegar até nós, retirando todos os obstáculos que nos afastam d’Ele – os nossos pecados e todo o mal que sentimos no coração. A imagem do monte e “colina abatidos" quer ilustrar que Deus vai abaixar as grandezas do mundo, chamando a humanidade à humildade e conversão. v. 6) Jesus é o portador da salvação de Deus, que chegará a todos os que seguirem o cominho de conversão. Julgamento e conversão (3, 7-14) v. 7-9) João adverte todos os ouvintes: os pecadores têm de se converter e não descansar na herança dos seus antepassados. O Senhor virá para todos os que tiverem sincero arrependimento, pois só estes conseguirão receber a Sua Palavra em seus corações. Os frutos de arrependimento são actos concretos que são sinal de uma mudança de vida verdadeira, aos quais João se refere nos v. 10-14. v. 10-14) João refere que a conversão é mesmo para todos, sobretudo para os que eram vistos como pecadores – cobradores de impostos e soldados. Os primeiros passos para a conversão consistem na partilha dos bens com quem precisa, na generosidade no seu trabalho de cada dia, deixando de lado o egoísmo, a ganância e a ambição desmedida. Anúncio da vinda do Messias (3, 15-18) v. 15) A designação de Messias (do hebreu Mashiah) era muito frequentemente associada a um salvador político da nação, mas tem o mesmo significado que o nome Christós, que é aquele que recebeu a unção divina. Percebendo que o povo estava na expectativa do Messias, João realça que é apenas o Seu precursor e a sua pequenez diante de Jesus. v. 16) Por isso, João designa Jesus de “forte”: enquanto João baptiza na água, um baptismo de conversão, Jesus baptizará no fogo, o baptismo no Espírito: inaugurado no Pentecostes, este baptismo purifica-nos e transforma-nos como seres novos diante de Deus, tornando-nos Seus filhos, para quem o Reino de Deus está reservado. v. 17) Em seguida, João evoca o juízo final, em que a escolha dos eleitos (o trigo) será feita e estes serão acolhidos no Reino de Deus, figurado pelo celeiro. Prisão de João Baptista (3, 19-20) v. 19) Mt 14, 3-4 e Mc 6 17-18 descrevem com mais detalhe as razões da prisão de João, que LUCAS prefere resumir. Herodíade era neta de Herodes, o Grande. Ela abandonou o marido, seu tio, para se juntar com o irmão deste, Herodes Antipas. João denuncia esta situação de adultério, algo que não agradou a Herodíade e Herodes, e que conduziu à sua prisão. v. 20) Com este episódio, LUCAS encerra a missão de João e escolhe fazê-lo antes do episódio do Baptismo de Jesus, para realçar que a missão de João e a missão de Jesus representam dois períodos distintos da História da Salvação. Baptismo de Jesus (3, 21-22) LUCAS não menciona o nome de João nesta passagem, pois com o baptismo de Jesus, termina o tempo de João. Separa, para acentuar a diferença, o baptismo de Jesus da teofania em que Deus revela a Jesus a Sua filiação divina. Ao receber o baptismo, Jesus manifesta a Sua solidariedade com o povo. O Seu baptismo é um acontecimento público que vem cumprir o baptismo do povo de Israel. Termina o movimento preparatório de conversão; segue-se o tempo messiânico. Jesus é ungido pelo Espírito e é reconhecido como Filho de Deus. O momento de oração é o momento deste encontro do Filho com o Pai, e a citação do Sl 2, 7 (“Tu és o meu Filho muito amado…”) indica a entronização messiânica de Jesus pelo Pai e o início da Sua missão. A Palavra do Pai é a revelação do mistério de Jesus por excelência. No entanto, Jesus só exercerá plenamente o seu poder real na glória pascal da ressurreição. Genealogia de Jesus Cristo (3, 23-38) A finalidade principal de uma genealogia no mundo bíblico é a de fundamentar o direito de posse de uma terra, ao estatuto sacerdotal ou até à legitimidade dinástica. LUCAS procura legitimar a messianidade de Cristo com a sua descendência davídica, através da apresentação da genealogia de Jesus. MATEUS também apresenta uma genealogia, mas ambas têm algumas diferenças: as duas genealogias apenas se cruzam nos nomes de José, na descendência desde Abraão até David e nos nomes de Salatiel e Zorobabel. LUCAS não apresenta alguns reis na genealogia, entre Salatiel e David, devido a algumas reservas perante a realeza do mundo terrestre, mas introduz alguns profetas, como Eli, Amós, Naum e Natan, pretendendo assim colocar Jesus mais na linha dos profetas do que na linha dos grandes do mundo terrestre. Outras diferenças são: - MATEUS conta 42 (3x2x7) gerações e LUCAS conta 77 (11x7) gerações; - MATEUS coloca a genealogia no início do evangelho, e LUCAS apenas o faz após a referência à filiação divina de Jesus no baptismo; - MATEUS liga Jesus a Abraão, enquanto que LUCAS liga Jesus a Adão, para realçar a Sua ligação com toda a humanidade. Jesus é o novo Adão, o protótipo de uma nova humanidade. Jesus tentado no deserto (4, 1-13) Jesus é conduzido pelo Espírito ao deserto, e é submetido à tentação, tal como Adão, referido na sua genealogia. Mas Jesus não cede à tentação e sai vitorioso do combate com o Mal. A permanência de quarenta dias evoca a estada do povo de Israel no deserto após a saída do Egipto, onde pecaram contra Deus que os salvou, ao adorarem um deus pagão. Esta vitória inicial de Jesus sobre as forças do Mal fundamenta os seus milagres e exorcismos posteriores. v.2) O inimigo oposto a Deus aparece na Bíblia com vários nomes, como Satanás, Belzebu e Belial. v.3-4) A filiação divina de Jesus é a primeira tentação que o diabo usa: porque não Jesus aproveitar esta filiação para escapar à fome e miséria dos homens? Jesus responde implicitamente que só Deus basta perante qualquer dificuldade e que não quer fazer milagres apenas para seu proveito. v.5-8) A segunda tentação que LUCAS apresenta – é a terceira em MATEUS - apoia-se no poder político sobre o mundo, algo que Jesus sabe ser fugaz e temporário e que vem apenas do mal. Esta tentação pressupõe que Jesus ainda não alcançou a Sua realeza, e a Sua recusa indica que este só quer receber a realeza que vem do Pai, segundo o caminho da pobreza, do sofrimento e da cruz. v. 9-12) A terceira tentação refere-se ao espaço físico – Jerusalém – onde ocorrerá a Paixão de Cristo. O pináculo do templo era uma parte alta ou a cornija superior de uma das portas do Templo onde a multidão habitualmente se congregava. LUCAS coloca esta tentação em último lugar porque quereria sublinhar o que lhe parece ser a maior tentação para Jesus: a de renunciar à morte por ser Filho de Deus. Jesus recusa usar este título a Seu favor, respeitando a soberana liberdade e vontade do Pai. v. 13) O diabo surgirá noutros confrontos, tais como curas e exorcismos, mas o confronto final dar-se-á na Paixão, que culminará no triunfo definitivo da Ressurreição. LUCAS procura assim demonstrar que Jesus não quer aproveitar-se da Sua filiação divina, mas que a Sua vontade é a vontade do Pai e cumprir a missão messiânica. O poder do mundo é exposto como algo que vem do Mal e que devemos renunciar. Onde tantas vezes nós falhamos, Jesus mostra-nos, na Sua condição humana, que podemos sair vitoriosos, se repousarmos em Deus toda a nossa fé e toda a nossa vida. A introdução ao Evangelho termina com esta passagem. O Evangelho da infância mostrou o mistério de Jesus definido pelas mensagens dos anjos e dos profetas. As cenas do prelúdio da missão mostraram a consciência de Jesus da Sua missão a que o Pai o chama e a sua vitória radical sobre o Mal, que terá o seu expoente máximo na Paixão e Ressurreição.