7 de dez. de 2011

SOBRE O EVANGELHO SEGUNDO SÃO MARCOS



Sobre a origem e o autor

O Evangelho de São Marcos (Mc) é considerado o mais antigo dos evangelhos contidos no Novo Testamento. Terá sido a referência para a redacção dos outros Evangelhos Sinópticos (São Mateus e São Lucas), no esquema histórico-geográfico que apresenta.

A data provável de escrita de Mc terá sido pouco antes da destruição de Jerusalém, por volta do ano 70, embora haja alguma discussão neste ponto, pois o capítulo 13 de Mc introduz um conceito apocalíptico da espera da vinda de Cristo, que surgiu entre os cristãos após a destruição do Templo. Sendo assim, a redacção de Mc poderá ter sido pouco após a queda do Templo em Jerusalém.

Atribui-se a redacção deste evangelho a João Marcos, filho de Maria, cuja casa disponibilizava para os cristãos se reunirem e orarem, como se pode ler em Act 12, 12. Marcos começa a sua vida cristã acompanhando Paulo e o primo Barnabé nas primeiras viagens, mas posteriormente, afasta-se, numa viagem à Panfília. Ainda se associa a Barnabé numa ida a Chipre, mas depois liga-se mais a Pedro, de quem se pensa que terá recolhido a maioria das informações e dados que, juntamente com a inspiração divina, terão contribuído para a redacção do Evangelho. Pedro refere-se a Marcos como “filho” em 1 Pe 5, 13, pelo que haveria uma grande proximidade.


Sobre a obra

O Evangelho segundo São Marcos reflecte a catequese de Pedro, apresentando uma fase mais primitiva da reflexão da vida de Cristo, desde o Baptismo até à Ascensão, não contendo escritos sobre a infância de Jesus, como Mateus ou Lucas.

Apresenta um estilo simples, com poucos discursos - só apresenta as parábolas e o discurso escatológico – e muitas narrações (e.g. a filha de Jairo). Usa algumas expressões em aramaico (e.g. “Talitha qûm”) e é o único texto bíblico em que Jesus é chamado de “filho de Maria”, pouco comum, pois na altura, um homem era sempre indicado como filho segundo o nome do pai. Marcos tem uma preocupação sempre presente em explicar costumes judaicos, quando necessário, o que situa este Evangelho num contexto pagano-cristão. Refere-se insistentemente a perseguições por causa da Palavra, evocando as experiências vividas pelas comunidades cristãs durante a perseguição de Nero em Roma, no ano 64.

A obra encontra-se dividida em duas partes essenciais:

1ª parte – Quem é Jesus? Pedro responde :”Tu és o Messias!” (Mc 1 – 8, 30);

2ª parte – De que maneira Jesus se realiza como Messias? Morrendo e ressuscitando. (Mc 8, 31 – 16, 20).

Dentro destas duas partes, pode dividir-se o texto em cinco secções:

1ª secção – Preparação do ministério de Jesus (1, 1-13);

2ª secção – Ministério na Galileia (1, 14 – 7, 23);

3ª secção – Viagens por Tiro, Sídon e a Decápole (7, 24 – 10, 52);

4ª secção – Ministério em Jerusalém ( 11, 1 – 13, 37);

5ª secção – Paixão e Ressurreição de Jesus (14, 1 – 16, 20).


Sobre a teologia

A cristologia fundamental da obra é que Jesus de Nazaré é verdadeiramente o Messias que, com a Sua Morte e Ressurreição, demonstrou ser verdadeiramente o Filho de Deus que a todos possibilita a salvação.

Jesus, em Mc, é simultaneamente humano e divino: verdadeiro Homem e verdadeiro Deus, e por isso, o próprio Jesus se refere a si mesmo como Filho do Homem, sendo que o termo Filho de Deus só se revela após a Paixão, através das palavras do centurião diante da cruz, altura em que Jesus realiza plenamente a Sua Missão como Messias sofredor e Salvador. Por isso, toda a acção se desenrola perante o segredo messiânico no qual Jesus insiste, pois a Sua revelação só pode ser compreendida à luz da Paixão e Ressurreição.

Na primeira parte da obra, encontra-se um Jesus preocupado em acolher às pessoas e às suas necessidades, e na segunda parte, Jesus dedica-se a formar os Apóstolos e introduzi-los na intimidade do Pai. Esta formação é exigente e o discípulo de Jesus é apresentado frequentemente como alguém que não compreende bem a missão que lhe é atribuída e não entende verdadeiramente quem é Jesus. A incompreensão dos discípulos é uma das principais características de Mc: neste, qualquer cristão acaba por se sentir melhor retratado.

Mc apresenta-nos um Jesus enigmático e difícil de compreender, envolto no segredo messiânico que só se revela a nós se nos abandonarmos definitivamente à Sua Palavra. Mc deixa-nos perante o incompreensível, perante a verdadeira natureza inexplicável da fé.


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