8 de fev. de 2011

1ª PARTE (cont.) - SERMÃO DA MONTANHA (caps. 5-7)


O Kérygma ou o grito do arauto que proclama a notícia é o primeiro anúncio da mensagem, introduzido por João Baptista e proclamado por Jesus. Lemo-lo no capítulo anterior, na pregação do Reino e resposta dos discípulos. Uma vez que os ouvintes aderiram ao Kerygma, o Sermão da Montanha vem como catequese para completar a sua instrução. Destinado aos recém-convertidos que foram alcançados pela mensagem e chamamento de Cristo, apresenta um novo programa de vida para o futuro. É o discurso inaugural da nova Lei do Reino. Trata da nova justiça cristã, proclamando o Reino de Deus, revelado nos milagres que são descritos seguidamente. Este Sermão é um apelo de Jesus a quem deseja segui-l’O, feito em confronto com a Antiga Aliança.
As Bem-aventuranças resumem e sintetizam o anúncio da Boa-Nova, cujos frutos surgem no decurso do Evangelho, nas mudanças que Jesus opera sobre os pecadores, os enfermos e em todos os que vai encontrando. É uma experiência de vida a ser levada por aqueles que aceitaram seguir Jesus, não sendo uma lei mas uma proposta de vida nova da qual somos convidados a participar.

O Sermão da Montanha apresenta uma estrutura com a seguinte divisão:

      1) Exórdio: anúncio da Boa-Nova
- As Bem-aventuranças (5, 3-12);
- O Sal e a Luz (5, 13-16);

      2) Corpo do Sermão:
- A nova justiça (5, 17-48): o que significa, no comportamento quotidiano, fazer a experiência da Boa-Nova;
- A piedade autêntica (6, 1-18): com que espírito se deve cumprir as boas obras tradicionais quando se é Filho de Deus;
- Confiança para com o Pai (6, 19 – 7,12)
     
      3) Conclusão do Sermão (7, 13 – 27): quem é discípulo e como deve sê-lo.


Exórdio: As Bem-aventuranças (Mt 5, 3-12)

As Bem-aventuranças desenvolvem uma doutrina para quem já está no caminho. Acentuam as disposições interiores necessárias para acolher o Reino de Deus e são uma introdução ao catecismo para os cristãos. As exigências são difíceis, mas recompensadoras para os discípulos que já sabem que se trata da sua felicidade. As oito Bem-aventuranças constituem um todo, que se abre e fecha com a mesma expressão esclarecedora (“porque deles é o Reino do Céu”, v. 3. e v.10).
A expressão “Felizes” é usada na Bíblia quando se pretende felicitar alguém por um dom recebido ou anunciar uma alegria. Com o uso desta expressão, Jesus indica quais os discípulos que estão em condições mais favoráveis para receber o Reino de Deus. Esta palavra implica ao mesmo tempo uma felicitação para com quem marcha já no bom caminho, e um programa de vida que, no fim, será recompensado por Deus.

As Bem-aventuranças podem dividir-se em dois blocos:
1º bloco (v. 3-9): dedicadas à pobreza e atitude de confiança para com Deus;
2º bloco (v. 10-12): sobre a perseguição, orientando um comportamento.

1º Bloco

Felizes os Pobres em espírito, porque deles é o Reino do Céu.
 Pobres em espírito” ou “pelo espírito” são aqueles que, mediante as provações de ordem material e espiritual, aprenderam a confiar apenas em Deus. A pobreza interior é condição para entrar no Reino e implica uma atitude de humildade, pela qual o crente recusa dominar os seus irmãos e fia-se em Deus para assegurar os seus direitos.

Felizes os que choram porque serão consolados.”
Os que choram” são aqueles que não perdem a esperança no Senhor. São felizes pois, em suas provas, mantêm-se fiéis e confiantes no conforto de Deus.

Felizes os mansos, porque possuirão a terra.”
Os mansos” têm uma ligação estreita com a pobreza. Jesus apresenta-se como manso em Mt 11, 29, e requer a aprendizagem desta atitude por parte dos Seus discípulos. “Posse da terra” está relacionada com a Terra Prometida, sendo equivalente ao Reino de Deus.

Felizes os que têm fome e sede de justiça, porque serão saciados.”
Fome e sede de justiça” é uma exigência de vida perfeita, de uma fidelidade maior à Lei de Deus. Quem tem sede de justiça, verá as causas que defende realizarem-se pela mão do Senhor.

Felizes os misericordiosos, porque alcançarão misericórdia.”
Deus perdoa a quem usa de misericórdia. Esta implica as obras de misericórdia indicadas em Mt 25, 31-46 e sobre as quais Cristo julgará a humanidade.

Felizes os puros de coração, porque verão a Deus.”
Puros de coração” são os simples e sinceros (muito mais amplo do que castidade ou perfeição moral), coerentes entre o seu agir e as intenções do coração. Ver a face de Deus significa ter a entrada para o Senhor junto de si: feliz o que recusa toda a duplicidade, pois terá com Deus uma intimidade maravilhosa.

Felizes os pacificadores, porque serão chamados filhos de Deus.”
 Pacificadores”: os que trabalham pela paz. Serão chamados filhos de Deus pois imitam Deus, autor de toda a paz (tal pai, tal filho).

2º Bloco

Felizes os que sofrem perseguição por causa da justiça, porque deles é o Reino do Céu.”
Perseguidos”, mas apesar das oposições, cultivarão as virtudes das Bem-aventuranças: a estes Deus quer confiar o Seu Reino. A seguir à Bem-aventurança dos perseguidos em geral, vem a aplicação aos discípulos. Pela sua fidelidade total ao Senhor, os discípulos são convidados à confiança e à alegria e podem esperar uma recompensa grande no Céu. A nona bem-aventurança (v. 11-12) ressoa, assim, como um som novo. Passa-se da perseguição “por causa da justiça” para a perseguição “por minha causa”. Dá-nos a certeza de que o sofrimento suportado por causa de Cristo cria, com Ele, uma solidariedade que garante a salvação.



Exórdio: O Sal e a Luz (5, 13-16);

Após a condição de felicidade dos discípulos anunciada nas Bem-aventuranças, esta passagem fala sobre a responsabilidade de viver segundo os valores do Reino, através de duas imagens: o sal e a luz.

“Vós sois o sal da terra” (Mt 5, 13)
Tal como o sal dá sabor aos alimentos e os conserva, assim também os discípulos se devem comportar no meio da humanidade. Os crentes conferem ao mundo o sabor e a conservação do Reino de Deus mas, se deixam de viver no espírito das Bem-aventuranças, perdem a sua função.

Vós sois a luz do mundo(Mt 5, 14)
A luz surge com duas comparações: como uma cidade sobre a montanha (v. 14) e como lâmpada na casa (v. 15). A cidade-luz lembra a vocação de Jerusalém em Is 60, como futuro centro da reunião das nações, vocação esta realizada graças à fidelidade exemplar de Israel à Lei, pois o Povo eleito estava consagrado como luz das nações (Is 42, 6). Os cristãos assumem esta nova cidade-luz, a Igreja: uma luz sobre o monte, luz que irradia do Pai celeste. A lâmpada na casa refere-se aos discípulos: estes são luz do mundo através das suas boas obras. A comunidade dos discípulos testemunha pelas suas boas obras ou “obras de misericórdia” o Reino de Deus. Por este seu testemunho, a humanidade dará glória ao Pai, descobrirá os valores do Reino e aderirá a eles.

Um comentário:

  1. As Bem-aventuranças são um caminho, um mapa para encontrar Deus, para encontrar o Seu Reino. O Seu Reino somos nós, ao viver num testemunho verdadeiro de amor e justiça para com o próximo, numa entrega confiante das nossas vidas ao Senhor. Se todos confiássemos e fossemos humildes, se todos procurássemos a paz e lutássemos pela justiça, se todos fossemos mansos e puros de coração, certamente não haveria na terra um único ser humano em sofrimento. Estaríamos todos na Terra Prometida, no Reino do Céu. Parece tudo muito idílico mas, será tão impossível assim? Será tão difícil sermos sal da terra, sermos luz no mundo e deixar Deus alumiar a humanidade através de nós?

    Um abraço fraterno em Cristo!

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