31 de mar. de 2012

II. Ministério na Galileia (Mc 4 - 6)

Mc 4 - PRIMEIRO DISCURSO - PARÁBOLAS


Mc 4, 1-9: Discurso em parábolas: o semeador

Este constitui o primeiro grande discurso deste Evangelho (o segundo discurso é o discurso escatológico). As parábolas são tiradas do quotidiano doméstico, dão-nos a compreender a missão de Jesus, desde que estejamos em sintonia com a Sua mensagem, senão parecem-nos difíceis de compreender.
A parábola do semeador é especialmente dedicada aos ouvintes de Jesus.


Mc 4, 10-12: O porquê das parábolas

Faz-se uma distinção entre multidão e discípulos: Jesus fala a todos mas só explica aos discípulos. Porquê? Na mentalidade judaica, o v.12 é equivalente a “eles, por mais que olhem, não vêem, por mais que ouçam, não entendem, a não ser que se convertam e Deus lhes perdoe”. A chave para a compreensão das parábolas está no Reino de Deus: o segredo é dado a revelar a quem se converte de coração a Deus – só a estes é dada a explicação, pois já acolheram a Jesus e estão abertos à Sua mensagem. Os que “estão de fora” não são a multidão necessariamente - que não escuta a explicação - mas antes, todos os que ficam de fora da fé, ou seja, os que não aderem a Cristo.

Mc 4, 13-20: Explicação da parábola do semeador

Jesus começa por sublinhar a ininteligência dos discípulos ao não compreender a parábola: esta crise não será resolvida até ao fim e fica em aberto para nós – também nos diz respeito, pois cabe-nos a todos abrir o nosso entendimento para compreender e viver a Palavra de Deus.
O Semeador é Cristo, pois revela o Pai, a Semente é a Palavra, que Cristo semeia em nossos corações, e a Terra representa cada um de nós, que recebe e escuta a Palavra. Existem vários tipos de terra, ou seja, vários tipos de ouvintes:
- A terra à beira do caminho onde as aves comem as sementes recebidas, representa todos aqueles que não recebem a Palavra, porque deixam que o mal retire esta dos seus corações;
- O terreno pedregoso representa todos os que recebem a Palavra com alegria, mas não estão enraizados em Cristo, pelo que desfalecem perante as dificuldades;
- O terreno com espinhos representa todos os que se deixam levar pelas seduções do mundo, que impedem a adesão à Palavra;
- A boa terra simboliza todos os que acolhem verdadeiramente a Palavra e a vivem com fé: estes dão frutos, através das boas obras que praticam.


Mc 4, 21-23: A lâmpada

A lâmpada simboliza, simultaneamente, os nossos actos e a Palavra de Deus.
Os nossos actos, se forem fruto da Palavra, não se devem esconder, mas sim serem revelados à vista de todos para glória de Deus Pai.
Também a Palavra de Deus, que traz em si uma luz imensa, não se consegue esconder. A Sua luz é tão intensa que será revelada a todos a seu tempo por Jesus Cristo.


Mc 4, 24-25: A medida

O êxito do discípulo depende da intensidade, atenção e diligência que põe no acolhimento da Palavra. Se não for suficiente, perde a Salvação, perde o que tem. Quanto mais empenho tiver, mais frutos o discípulo dará e mais perto este estará da salvação.


Mc 4, 26-29: O grão que germina

O Reino de Deus é autónomo e dinâmico no seu crescimento. É um Reino de ordem espiritual. Começa neste mundo, com a pregação de Cristo e consuma-se na Sua segunda vinda – “o tempo da ceifa”.
Vivemos no tempo da paciência, e não no tempo da ceifa. Confiando em Deus sem desanimar, deixemos a Palavra do Evangelho brotar em nós, a Seu tempo. A Palavra de Deus, semente do Reino, se acolhida com fé, terá um crescimento maravilhoso, mas é preciso ter paciência e esperar.


Mc 4, 30-32: O grão de mostarda

O Reino de Deus começa modestamente com a actividade de Jesus na Palestina – “grão de mostarda”, mas depressa atingiu o mundo conhecido de então, e continua hoje a crescer, em cada povo e em cada cultura – “a maior de todas as plantas do horto”.


Mc 4, 33-34: A função das parábolas

Jesus usa as parábolas para tornar mais simples e acessível a doutrina do Reino. Estas encerram um sentido oculto, cuja novidade eterna os discípulos se esforçaram por descobrir e também todos nós devemos continuar esse esforço, dia-a-dia, na nossa vivência cristã.




Mc 4 - 5: QUATRO MILAGRES, QUATRO ENSINAMENTOS


 Segue-se uma sequência de quatro milagres (4, 35 – 5, 42) com ensinamentos para os discípulos, que são as testemunhas destas quatro acções:
- Tempestade acalmada;
- Possesso de Gerasa;
- Cura da hemorróisa;
- Ressurreição da filha de Jairo.
Todos estes milagres estão encadeados no mesmo dia, após as parábolas, não com uma finalidade histórica, pois não seria possível fazer todos estes trajectos no mesmo dia, mas com uma finalidade catequética:

- Tempestade acalmada: o mar levanta um obstáculo para dissuadir Jesus de ir aos pagãos, mas Jesus domina o mar e os ventos;
- Exorcismo: o demónio não quer Jesus no seu local de acção, mas Jesus vence-o, mesmo no seu território de acção;
- Hemorroísa: só pela fé em Cristo poderemos alcançar a salvação;
- Filha de Jairo: a fé em Cristo salva-nos da morte e ressuscita-nos para a vida eterna.
Esta sequência (parábolas – milagres) reflecte a acção da Igreja junto dos pagãos – Jesus vem para salvar TODOS, o Seu Reino é para toda a humanidade. A catequese de Mc apresenta o reflexo da luz da Páscoa sobre a vida de Jesus, revelado apenas com o segredo, para uso dos discípulos e do leitor.

Mc 4, 35-41: A tempestade acalmada

Primeiro milagre do conjunto. O vento pode ser associado a maus espíritos, que pretendiam afastar Jesus do Seu propósito de pregar a outros povos.

v. 39: Jesus manifesta o Seu poder divino ao acalmar as águas: só a força do Criador tem poder sobre a criação. O sono de Jesus e a dúvida dos discípulos evocam a dúvida sentida por estes e a falta de fé na Ressurreição durante a Paixão e Morte de Jesus.

v. 40: Perante a questão “Ainda não tendes fé?”, Mc convida-nos a questionar a solidez da nossa fé. Os discípulos que suplicam para acalmar a tempestade representam a Igreja que, ameaçada pelas tempestades que vão surgindo ao longo da história, não se pode deixar abalar, tendo de gritar com fé sem medo e chamar Jesus, que está à “popa da embarcação”, pois Ele está connosco: se tivermos fé, seremos salvos.

Mc 5, 1-20: O possesso de Gerasa

Segundo milagre do conjunto. Gerasa ou Gadara é uma das dez cidades da Decápole, região exterior à Galileia. Este relato representa o choque de Jesus com as forças do mal, descrevendo a derrota do Maligno de uma forma aparatosa.

v. 12-13: Os demónios suplicam a Jesus pois reconhecem o Seu poder divino sobre o Mal; os porcos lançam-se ao mar, lugar associado na Antiguidade a monstros, símbolos do Mal.

v. 17: Os habitantes pedem a Jesus para se ir embora por medo do que aconteceu ou pelo prejuízo ao perderem os porcos, o que revela uma total incompreensão de quem é verdadeiramente Jesus. O medo afastou-os da fé, e impediu-os de alcançar a salvação.

v. 19-20: Desta vez, Jesus não pede silêncio sobre o milagre, antes envia o homem que tinha estado possesso para ser apóstolo na Decápole, região que não conhece Deus e o reino messiânico, na qual é preciso dar a conhecer o projecto de Deus.

Mc 5, 21-43: A filha de Jairo e a mulher com fluxo de sangue

Passagem que relata o terceiro e quarto milagres. A cura da hemorroísa vai estimular a confiança de Jairo na salvação da sua filha.

v. 26: A menção do falhanço dos médicos serve apenas para sublinhar o poder de Jesus, que tudo pode, ultrapassando em muito o conhecimento dos homens.
v. 27-28: É uma cura roubada, pois a fé da mulher é mais uma crença na magia, recorrendo ao toque no manto.
v. 31-34: Jesus torna esta cura roubada numa cura renovada: reconhece a mulher e diz-lhe: “A tua fé salvou-te”; a cura é dada de novo pela fé (salvação na fé), pelo que a mulher recebe mais do que procurava.

v. 35-36: Jairo tem de ter uma fé maior, pois a menina morre. Tem de acreditar que Jesus tem poder mesmo sobre a morte.
v. 39: “A criança dorme” - para Jesus a morte já não é morte, mas um sonho.
v. 41-42: “Menina, levanta-te” - não há fórmulas mágicas (as palavras são logo traduzidas), mas apenas a fé pessoal em Jesus que é exigida aos que são salvos.
v. 43: A preocupação em dar de comer à menina, revela a atenção e sensibilidade de Jesus.

Estes dois milagre apresentam um crescendo na fé:
- a fé original de Jairo, que consiste em curar a filha duma doença;
- a fé primitiva da hemorroísa na magia;
- a fé nova na relação com Jesus da hemorroísa (salvação pela fé);
- a fé plena de Jairo n’Aquele que ressuscita.

Estes milagres e curas dão-se longe da multidão para preservar o espaço sagrado e para manter o segredo messiânico, a ser revelado apenas na Páscoa. Pedro, Tiago e João são os únicos que acompanham Jesus: são as testemunhas escolhidas para os momentos altos (também estão presentes na Transfiguração).



Jesus toca em quem cura e ressuscita, sendo verdadeira presença física de Deus, fonte de todo o bem. Estes dois milagres apresentam o caminho para compreender o mistério da fé e chegar à fé pascal. Deus desperta-nos do sono da morte para a vida eterna. Deus toca-nos através do Seu Filho para nos dar a salvação.

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